sábado, 19 de janeiro de 2008

Manuel Alegre alerta para "erro colossal" da política de Saúde do Governo

Deputado socialista classifica como "estapafúrdias" opções de Correia de CamposManuel Alegre confirmou que vai assinar uma petição em defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS), liderada pelo histórico do PS, António Arnaut, e que junta, entre outros, elementos do Bloco de Esquerda e do PCP.O ex-candidato presidencial independente e deputado socialista, Manuel Alegre, teceu hoje duras críticas à reforma dos serviços de saúde, considerando que se trata de um "erro colossal" e de uma política "estapafúrdia" do actual Governo.

"As pessoas vão passar a nascer em casa ou a morrer em casa, para além daqueles que já andam a nascer pelo caminho", ironizou, ao abordar numa entrevista à jornalista Flor Pedroso, da Antena 1 - que vai para o ar ao 12h00 - a desertificação dos serviços públicos no interior.

Manuel Alegre confirmou que vai assinar uma petição em defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS), liderada pelo histórico do PS, António Arnaut, e que junta, entre outros, elementos do Bloco de Esquerda e do PCP. "A esquerda moderna deve reforçar o Estado social e não desmantelar o Estado social", declarou, sublinhando que, no poder, esta deveria garantir o reforço e viabilidade do SNS. "Estaria a mentir se dissesse que me reconheço (no actual Governo). Não, não me reconheço", afirmou.

"Parece que é isto que se está a fazer (desmantelar)", disse, acrescentando "não compreender esta política, não só das taxas moderadoras para tratamentos e cirurgias (uma dupla tributação), como a extinção de urgências e de Serviços de Atendimento Permanente e o encerramento de maternidades em zonas do interior, seja qual for a fundamentação técnica". "Isso é um erro colossal, porque as pessoas se sentem desprotegidas e abandonadas pelo Estado, sobretudo em regiões do país onde não há mais nada", declarou.

"Se tiram os serviços públicos do interior, as pessoas sentem-se abandonadas e desprotegidas, não foram criadas alternativas, as coisas não foram explicadas e é tudo feito por atacado", afirmou.

Alegre defendeu que estas medidas estão a "criar uma revolta muito grande" na população, porque os portugueses precisam de um "bom Serviço nacional de Saúde". "Eu já avisei que isto é perigoso", salientou, lembrando que até Jerónimo de Sousa foi "levado em ombros" na Anadia. "Se aparece uma Maria da Fonte, de saias ou de calças, arranja uma fronda popular, e isso pode pôr em causa um certo consenso nacional sobre a própria democracia", sublinhou.

Política de saúde "estapafúrdia"
"As condições de vida das pessoas não melhoraram" no interior e de repente tiram-lhes os serviços de saúde. As pessoas ficam aflitas", disse, sublinhando que isso "desgraça" a base social do PS e a confiança na democracia. Apesar do ministro da Saúde, Correia de Campo, ter sido seu colega em Coimbra e ser seu amigo, Alegre considerou que a sua política é "estapafúrdia".

Alegre reconheceu que o "Governo tem legitimidade democrática, porque ganhou com maioria absoluta", mas considerou que "os portugueses não se dão bem com as maiorias absolutas, sobretudo aqueles que governam e perdem um bocado a cabeça com as maiorias absolutas", sublinhou.

Inquirido sobre se se revia na prática do PS, afirmou que este partido "não o representa totalmente".

Alegre assume-se como uma das "referências" do seu partido, porque teve com ele socialistas de todo o lado na eleição presidencial e diz que "fracturou e muito" o eleitorado do Partido Socialista nessa contenda eleitoral.

Questionado novamente sobre se se revia na prática governativa do PS, respondeu: "Acho que não. Representa numas coisas e noutras não representa", esclareceu, destacando pela negativa "a destruição do Serviço nacional de Saúde", área onde diz que o Governo "não o representa com certeza".

"Mas houve coisas boas e que ficam", afirmou, destacando a interrupção voluntária da gravidez (IVG), a Lei da Paridade, e a Procriação Médica Assistida.

Alegre destacou também a forma como foi exercida a presidência portuguesa da União europeia, nomeadamente a realização das cimeiras da UE com o Brasil e com África, e a assinatura do Tratado de Lisboa, apesar de ter herdado o trabalho da Alemanha, o que conferiu a Portugal um desempenho global mesmo sendo um país pequeno.

O deputado socialista, que esteve ausente esta semana do Parlamento por razões de saúde, disse na longa entrevista à Antena 1 que teria "votado contra" a moção de censura ao Governo.

Alegre disse ser favorável ao referendo ao Tratado de Lisboa, mas reconheceu que essa forma de ratificação seria provavelmente "muito difícil".

O deputado socialista realçou a questão do "respeito pela palavra dada" e disse que se houvesse referendo isso teria sido "uma lição para os dirigentes europeus que tem medo de consultar os seus povos". "Há uma crise profunda", reconheceu, referindo-se ao socialismo na Europa.

"Sócrates fez coisas que outros socialistas não foram capazes de fazer", disse referindo-se aos aspectos positivos da acção do governo que mostram "independência" em relação ao conservadorismo da sociedade portuguesa e a uma abertura sobre certos valores da esquerda, só que para Alegre, "a esquerda não acaba aí".

Lusa, 19 de Janeiro de 2008